segunda-feira, 16 de maio de 2011

ribombar {um instante}

Uma repentina chuvada desanuvia a atmosfera grave e impaciente que há dias inquieta os nervos dos mais sensíveis. Majestosa, cessa inesperadamente cada ruído da cidade e distancia das ruas qualquer existência.
Naquele seu longo percurso, todos os dias demasiado acidentado, sobrepovoado, todos os dias demasiado veloz, ela encontra-se inteiramente só. Estática, comovida e de pés enregelados.
A robustez da instabilidade do ar e as massas abafadas desta tempestade de Maio testemunham mais um final na sua vida. A sua tia-avó morrera. Não chegara a conhecer como ansiava os filhinhos que dela nascerão.

O volume magistral de nuvens eléctricas que vê aproximar-se, sugerindo um gigantesco castelo errante, paralisam-na, permanecendo no limiar do deslumbramento e da apreensão. Experimenta o sublime naquilo que parece um cenário estudado de nítidos contornos, demasiado reais, duros e contrastados, e de uma luz muito fina e sedosa, filtrada pelos tons lilases do final de mais um dia.

Chove cada vez mais.
Cada vez mais.

E agora troveja.


Ela não corre, não se abriga. Entrega-se ao rigoroso peso da chuva que acomoda-se ao seu vestido de verão e às firmes gotas que aguilhoam-lhe prazerosamente a pele nua das pernas e dos braços. Sente a frescura da água na cara, pelas mãos, pelos cabelos.
Ali, ela e a tempestade. Nada mais.
A morte é também somente isto: um instante avassalador e irreproduzível, semelhante a um glorioso grito vivido de uma trovoada.

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